Querida internet,
Estamos no início de maio e preciso confessar que pifei. Já faz um tempo, na verdade, mas só agora consegui elaborar um pouco do que está acontecendo. Tal qual meu primeiro notebook, comprado em 2011 pelo equivalente aos meus três primeiros salários da vida, um dia a minha cabeça decidiu travar e não funciona mais como deveria. A diferença é que o notebook em questão aguentou nove anos e talvez eu tenha vindo com um defeito de fábrica.
Uma das minhas partes favoritas da internet sempre foi sentir que ela era o meu lugar e, ao mesmo tempo, o lugar de todo mundo. Falar sobre mim mesma era um assunto fácil e fluido (talvez isso esteja soando um tanto narcisista, espero que não – estou cansada de diagnósticos). Apesar de ter “aprendido” a escrever com a faculdade de jornalismo, o meu lance sempre foi despejar palavras em blogs, longas conversas com amigos virtuais e redes sociais das mais variadas, processando meus sentimentos e experiências conforme crescia. Porque tinha retorno, sabe?
Como não era apenas o meu lugar, a internet possibilitou que eu conhecesse e me aproximasse de pessoas incríveis. A gente se identificou, discordou, trocou vivências e fluxos de consciência. Sempre penso nessa parte da minha experiência com as redes sociais (e a internet, de modo geral) como algo meio mágico, porque de fato foi.
No entanto, à medida que os anos foram passando, a internet mudou e eu também. Por uma junção de fatores que nem cabe aqui, passei a me sentir intimidada ao compartilhar a vida para sabe-se lá quem. Não era só constrangimento (embora talvez eu devesse ser um pouco mais autoconsciente?), tinha também também toda a questão da privacidade alheia, sabe? Qual é o limite? Desde quando a vulnerabilidade se tornou uma moeda social? Será que isso não é só… desrespeitoso? Tudo isso começou a me consumir uns anos atrás e apenas não quis mais lidar.
Dito isso, vou apenas ignorar o último parágrafo e voltar às origens pra fazer um grande overshare. Afinal, quem eu quero enganar? Tenho 30 anos nas costas e um blog em pleno 2022.
Ultimamente sinto como se eu estivesse numa espécie de limbo. Não é uma sensação desconhecida, já estive nesse mesmo lugar em vários momentos da vida. Mas, dessa vez, parece que não encontro nada para me agarrar e sair daqui. Minha carreira, meus passatempos, meu relacionamento, meu futuro, meus sonhos e expectativas pro futuro… Não tem uma trilha de migalhas na floresta, nem tampouco um barbante no labirinto. Nada tem feito muito sentido, nada soa estável o suficiente para eu me apoiar.
Para uma pessoa obcecada por controle, dá pra imaginar que as coisas não estão dando muito certo.
Não sei direito como e nem quando tudo começou pois, como disse, o limbo não é um local relativamente familiar. Não acho que eu seja capaz de criar uma linha do tempo e dizer com propriedade “É galera, foi aqui que deu ruim.” Mas uma coisa é certa: essa história de morar fora do país ativou gatilhos que nem sabia que existiam. Quando dei por mim, estava mal.
Mal mesmo.
Eis que voltei a morar no Brasil. Acho que essa foi uma das decisões mais difíceis que já tomei na vida. Afinal, ainda que seja a minha decisão não envolve apenas a minha vida. Seis anos atrás fui ao cartório assinar uns papéis pra dividir a vida com alguém – e essa pessoa está bem profissionalmente na França, gosta de morar lá e não fica completamente perturbado das ideias com as constantes mudanças. Tenho tentado rejeitar o sentimento pegajoso de culpa que o amor romântico carrega. Alguns dias dá certo, em outros não.
Por outro lado, foi a primeira vez em muito tempo que me permiti querer algo e agir de acordo com esse desejo. Fechei os olhos, respirei fundo e foquei no que era melhor para mim. Foi uma sensação de alívio, de esperança. Algo acendeu dentro de mim, como se fosse a fagulha da revolução contra o autoboicote. Faz tanto tempo que reprimo meus próprios sonhos (não pois alguém me força a sufocá-los, mas porque não me sinto merecedora e aprendi de uma forma distorcida que amar é sacrificar os próprios desejos em prol do outro – é, eu sei… pesado).
Nesse meio tempo entre perceber que estava muito mal e tomar decisões aconteceram muitas coisas, entre elas: tive um burn out (quem não?); pedi demissão do meu emprego após finalmente admitir pra mim mesma que odeio ser designer apesar de não fazer a menor ideia do que farei, profissionalmente falando; voltei a morar na casa da minha mãe, no quarto em que vivi durante a maior parte da minha vida (tem sido uma experiência de estranha familiaridade, porque muita coisa mudou mas ao mesmo tempo tudo continua igual? é confuso e conflitante); passei no reumatologista e descobri que tenho alto potencial de desenvolver uma doença autoimune um tanto assustadora (e, por isso, preciso fazer uma bateria extensiva de exames a cada seis meses pelos próximos cinco anos); pratiquei a surdez seletiva em conversas com o único propósito de questionar minhas atitudes (“Mas você não tem medo de acabar com seu casamento assim?” “Tem CERTEZA de que está fazendo a coisa certa?” “Talvez você só precise encontrar seu propósito…” “Mas você não tem cara de quem está com depressão” “Vocês não estavam planejando ter filhos?”); gastei dinheiro impulsivamente mesmo tendo plena consciência de que não tenho mais um emprego fixo; evitei enfrentar meus problemas gastando todo meu tempo e energia cuidando de outras pessoas e suas crises porque, de alguma maneira egoísta, ajudá-las me fazia bem; finalmente passei no psiquiatra e comecei a tomar antidepressivos pra algo que deveria ter sido diagnosticado anos atrás; pensei que nunca mais fosse chorar até que abri as torneiras e achei que nunca mais fosse parar.
Ou seja, está tudo esquisito.
Estou tentando dar tempo ao tempo e confiar no processo, pois sei que estou fazendo tudo que está ao meu alcance para ficar bem. Ao mesmo tempo, tô segurando tanta coisa há tanto tempo que tudo vai implodir. E eu estou plenamente consciente disso. Parece que minha cabeça está constantemente ligada, desesperada para achar uma solução enquanto meu corpo não tem um pingo de energia para agir de fato e mudar algo. E aquele sentimento pegajoso de culpa? Ele está por todos os lados e tenta alfinetar que a minha realidade é bem privilegiada e “muito melhor que a maioria”.
Então, por que não consigo simplesmente me conformar? Por que minha cabeça não fica em silêncio? Será que sou tão mimada assim? O que é esse sentimento constante de insatisfação e baixa autoestima? Como me livro disso? É possível se livrar? Como saber se estou exagerando e me preocupando com coisas que inventei ou se estou dando pouca importância aos problemas reais? Por que tenho medo de tudo? É só o combo de ansiedade & depressão ou tem algo a mais? Como pessoas normais funcionam? Todo mundo diz que sou forte, então por qual motivo me sinto tão fraca o tempo todo?

Os dias passam e sinto como se tivesse apenas dois estados: um descontrole irracional, pensando sem parar e beirando a histeria, falando um pouco alto demais e rápido demais; e outro completamente entorpecido, emocionalmente exausto, conformada em não fazer nada, afinal ‘vamos-todos-morrer-mesmo-nada-faz-sentido-ou-diferença’.
Qual é o meio termo? Eu não sei. Ainda.
Antes que você se pergunte, sim, comecei com a medicação e estamos em fase de ajustes. Mas não é como se tudo isso (agora você me imagina gesticulando pros parágrafos acima) fosse novo. Na verdade, é só uma amostra grátis da minha cabeça.
Esse é um post sem respostas e sem pé nem cabeça, mas cansei de guardar notas secretas no celular e rabiscar páginas de cadernos enquanto tento manter as aparências (sem muito sucesso, hah). 99% do que resta do meu bom senso me suplica para não clicar no botão de publicar, mas 1% de mim acha que o que quer que isso seja, é uma parte importante e válida do processo. Sinto uma espécie de alívio de… colocar assim, pro mundo, um pouquinho de tudo que tá acontecendo.
Do fundo do meu coração desequilibrado,
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